domingo, 22 de março de 2015

MEU ALERTA À COMUNIDADE JURÍDICA

Nunca pensei que escreveria, como diria meu falecido avô, sobre o “óbvio ululante”.

O art. 154, IV da Lei 13.105/2015 (novo código de processo civil) determina que Incumbe ao oficial de justiça certificar, em mandado, PROPOSTA de autocomposição APRESENTADA POR QUALQUER DAS PARTES, na ocasião de realização de ato de comunicação que lhe couber. (destaquei)
Esse dispositivo legal nada tem a ver com a conciliação, eis que neste instituto (conciliação) as propostas de solução das controvérsias são feitas pelos conciliadores (não pelas partes). Em minha opinião, o Oficial de Justiça que apresenta propostas e depois sai opinando nas demandas é parcial.

O Poder Judiciário é a última esperança das partes atormentadas. Toda parte processual tem ao menos um problema, uma pretensão ou um direito potestativo, que julga indevidamente tolhido por outrem. Isso a impede de conseguir tranquilidade necessária a uma vida feliz.

A Jurisdição existe para apaziguar a alma das partes com a Justiça. Todos nós, que estamos aqui hoje buscando melhorarmos nossas vidas profissionais, um dia já buscamos estar Oficiais de Justiça. Desde muito antes da Grécia Antiga, o homem tenta – em vão - conceituar a Justiça. E todos os diversos conceitos já elaborados sempre diminuíram a plenitude do verdadeiro significado desta palavra.

A Justiça, simples e forte palavra de sete letras, não consegue seu verdadeiro significado na racionalidade, e sim na sensibilidade de cada ser humano. A República Federativa do Brasil incumbiu ao juiz o dever de sentir a Justiça. E nós, Oficiais deste sentimento, ficamos com a difícil e importante missão de efetivá-la.

Com tão difícil missão de efetivar a Jurisdição (e enquanto seres humanos que somos), também partilhamos dos sentimentos dos magistrados e sentimos suas decisões para podermos efetivá-las. Sentir a justiça é ser imparcial.

Ser imparcial é se colocar no lugar das partes, observando cada demanda como única e como componente de sua própria vida. Os juízes, a partir do garantismo e buscando ao máximo a imparcialidade, estão separando as conciliações das verdadeiras decisões decorrentes das lides.
Em âmbito penal, o juiz que faz propostas de conciliação já não é o mesmo que conduz as demandas criminais. Em muito pouco tempo, essa conduta judicial também se solidificará nos mais variados ramos do Direito.

O Oficial de Justiça, como o juiz, sente. O Oficial de Justiça sente as dores alheias e exerce parcela Jurisdição quando, por exemplo, se compadece da pobreza de uma parte e deixa de penhorar seu bem de família; na forma de expulsar de casa um marido violento; quando “toma” um filho de uma mãe e o entrega para o pai em uma sempre traumática demanda de mudança de guarda etc..

Ao executar as mais diversas constrições judiciais, buscando a máxima efetividade ao vencedor e a mínima lesividade ao vencido, o Oficial de Justiça Sente a Sentença do Juiz. Por tal, deve ser o Oficial de Justiça Imparcial seguindo o exemplo garantista dos magistrados na Seara Penal.

O Oficial de Justiça parcial age como um demônio, pois traz às partes atribulação ao invés de paz. Este, que deveria chamar-se Oficial de Injustiça transforma o Perfume de Justiça em Perfumaria de Direito, destruindo todos os trabalhos dos sujeitos processuais, assim como as vidas das partes e o próprio Estado Democrático de Direito.

Uma lei, qualquer que seja, que um dia resolva dar ao Oficial de Justiça a incumbência de conciliar propondo soluções para as partes deverá lhe retirar a capacidade de sentir a sentença dos magistrados, sob pena de flagrante inconstitucionalidade.

“Oficial de Justiça Conciliador”, que pisa no campo exclusivo da vontade partes e troca o “sentire” pelo “opinare” não consegue – jamais - demonstrar sua imparcialidade nas demandas em que atua. O “Oficial de Justiça Conciliador”, por mais que negue, contamina o processo, o magistrado e a sociedade para a qual se volta a sentença.

Nietche tem um livro chamado “Assim Falou Zarastutra”, no qual expõe que: "Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar para atravessar o rio da vida. Ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias.". Quanto vale a imparcialidade no exercício da profissão de Oficial de Justiça? A minha, “mes amis”, não tem preço.


Por isso, qualquer proposta legislativa no sentido de que o mesmo oficial de justiça que tentou conciliar atue constritivamente em relação à demanda entre as partes é por mim peremptoriamente rechaçada!

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

O PAI "NEM, NEM"

Hoje, eu vivi uma História. Hoje eu também quis escrever sobre o pai "Nem, Nem". O pai "Nem, Nem" é o que nem é presente na vida do filho, nem arca com o sustento da prole. O pai "Nem, Nem" é um verdadeiro crápula.
O pai "Nem, Nem" pode ser um péssimo pai, mas nada o impede de ser um bom contribuinte da previdência social. Esse tipo de pai, ao menos sob a ótica do sustento da prole, vale mais morto do que vivo. Isso porque a previdência do INSS nunca atrasa e muitas vezes a pensão por morte é maior que a pensão alimentícia do pai enquanto vivo.
Continuando: hoje, fui citar um homem para que pagasse duzentos e poucos reais no prazo de três dias a título de verba alimentar, sob pena de prisão. Como ele morreu há poucos dias, obviamente deixei de citá-lo. Minutos depois, fui intimar a genitora (e representante) do menor - agora órfão de pai - nessa demanda de alimentos para que prestasse informações relevantes àquele processo em audiência.
Após intimá-la, a mãe do menino me disse já saber da morte de seu ex; que o falecido contribuía para a previdência regularmente e que apesar de não pagar alimentos devidamente, o falecido era um "pai presente"; que aquele menino com ela era o único filho do "de cujos" e que o menininho ficava inconsolável chorando com saudades do pai por diversos momentos desde que soube do óbito.
Essa foi a História mais triste desse meu dia de trabalho. A criança receberá do INSS a pensão por morte de um salário mínimo (muito mais que o valor da pensão alimentícia do processo) até completar 21 anos sem nunca ter qualquer tipo de atraso. Contudo, isso está muito aquém de qualquer consolo porque o falecido não era um pai "Nem, Nem.".
Hoje, eu quis escrever sobre o pai "Nem, Nem", mas vivi uma História. Porque vivi essa História acabei escrevendo sobre o pai que atrasa o que deve e que muitas vezes paga menos do que o que deve, mas é o pai que deixa saudade no coração de uma criança. Que Deus o Tenha.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

DIREITO DE REVOLTA




Há aproximadamente 402 anos, um espanhol chamado Francisco Suarez publicou (em Coimbra) a Defesa da Fé Católica apontando os defeitos da seita anglicana. A obra Defensio Fidei Catholicae (Defesa da Fé Católica), de 1613, chegou ao Rei da Inglaterra. Na época, o Rei ficou com tanta raiva que determinou que essa doutrina fosse queimada em praça pública. Isso foi um ato de violência. O principal motivo de a obra de Francisco Suarez ter sido queimada na Inglaterra foi sua defesa da soberania popular.


Quando se está no ensino médio do Brasil, todo bom colégio leciona quem foi Jean Jacques Rousseau (Francês que viveu no século XVIII, escreveu “Do Contrato Social”). Para Rousseau, o homem é bom por natureza, sendo corrompido pela sociedade. O contrato social, segundo Rousseau, serve para que os indivíduos criem um pacto de associação e formem um Estado. O Estado para esse autor não é formado pela submissão, de modo que o contrato social deve ser completamente baseado no livre arbítrio. Para Rousseau, o poder resulta da simples soma das soberanias individuais.


A doutrina da Defesa da Fé Católica é bem mais antiga que a doutrina Do Contrato Social. Contudo, não menos importante ou instigante. Para Suarez, o pacto social não é uno como o de Rousseau, mas duplo. O espanhol defende que para que a sociedade se forme deve haver:


1) O pacto de associação;

2) O pacto de sujeição.


O pacto de associação se forma pela vontade dos indivíduos se associarem e formarem a sociedade; o pacto de sujeição determina quem irá exercer o poder.


Suarez defendeu que viver em sociedade é inerente à natureza humana. O autor argumentou que o poder não está pulverizado em cada indivíduo da sociedade (como fez Rousseau), mas que o poder só surge quando a sociedade ganha ares de instituição em decorrência da política. Partindo dessa premissa, quando a sociedade resolve instituir quem exercerá o controle social, instaurando seus governantes, surge uma sociedade com moral autônoma.


A sociedade política de Suarez é uma sociedade Moral. Meu exemplo mais simplificado desse pensamento é que podemos facilmente pegar uma arma de fogo, municia-la e fazer o disparo. Mas, se apontarmos errado a bala jamais atingirá o alvo porque as leis da física não podem ser (ainda) modificadas pela vontade humana.


Da mesma forma, Francisco Suarez defendeu que a soberania não é somente uma soma de vontades individuais da coletividade, mas um poder político que só existe em sociedades constituídas que busquem o bem comum. O Estado seria uma pessoa com moral própria, coexistindo com a moral da sociedade de modo harmônico.


Nessa ótica, o poder do povo que dava poder ao Rei. E o Rei era obrigado a seguir a vontade do povo, servindo ao bem da coletividade. Caso o Rei praticasse desvio de finalidade ao exercer o Poder (ou perdesse sua legitimidade) deveria ser deposto.


Os escritos de Francisco Suarez são leitura obrigatória para qualquer pessoa que goste de política, de direito internacional e de direito constitucional. Um homem que nasceu há mais de quatro séculos nos ensina, ainda hoje, que todo povo politicamente organizado SEMPRE terá o direito de se revoltar e de expurgar do poder os governantes ilegítimos.