Nunca pensei que escreveria, como diria meu falecido avô,
sobre o “óbvio ululante”.
O art. 154, IV da Lei 13.105/2015 (novo código de processo
civil) determina que Incumbe ao oficial de justiça certificar, em mandado,
PROPOSTA de autocomposição APRESENTADA POR QUALQUER DAS PARTES, na ocasião de
realização de ato de comunicação que lhe couber. (destaquei)
Esse dispositivo legal nada tem a ver com a conciliação, eis
que neste instituto (conciliação) as propostas de solução das controvérsias são
feitas pelos conciliadores (não pelas partes). Em minha opinião, o Oficial de
Justiça que apresenta propostas e depois sai opinando nas demandas é parcial.
O Poder Judiciário é a última esperança das partes
atormentadas. Toda parte processual tem ao menos um problema, uma pretensão ou
um direito potestativo, que julga indevidamente tolhido por outrem. Isso a
impede de conseguir tranquilidade necessária a uma vida feliz.
A Jurisdição existe para apaziguar a alma das partes com a
Justiça. Todos nós, que estamos aqui hoje buscando melhorarmos nossas vidas
profissionais, um dia já buscamos estar Oficiais de Justiça. Desde muito antes
da Grécia Antiga, o homem tenta – em vão - conceituar a Justiça. E todos os
diversos conceitos já elaborados sempre diminuíram a plenitude do verdadeiro
significado desta palavra.
A Justiça, simples e forte palavra de sete letras, não
consegue seu verdadeiro significado na racionalidade, e sim na sensibilidade de
cada ser humano. A República Federativa do Brasil incumbiu ao juiz o dever de
sentir a Justiça. E nós, Oficiais deste sentimento, ficamos com a difícil e
importante missão de efetivá-la.
Com tão difícil missão de efetivar a Jurisdição (e enquanto
seres humanos que somos), também partilhamos dos sentimentos dos magistrados e
sentimos suas decisões para podermos efetivá-las. Sentir a justiça é ser
imparcial.
Ser imparcial é se colocar no lugar das partes, observando
cada demanda como única e como componente de sua própria vida. Os juízes, a
partir do garantismo e buscando ao máximo a imparcialidade, estão separando as
conciliações das verdadeiras decisões decorrentes das lides.
Em âmbito penal, o juiz que faz propostas de conciliação já
não é o mesmo que conduz as demandas criminais. Em muito pouco tempo, essa
conduta judicial também se solidificará nos mais variados ramos do Direito.
O Oficial de Justiça, como o juiz, sente. O Oficial de
Justiça sente as dores alheias e exerce parcela Jurisdição quando, por exemplo,
se compadece da pobreza de uma parte e deixa de penhorar seu bem de família; na
forma de expulsar de casa um marido violento; quando “toma” um filho de uma mãe
e o entrega para o pai em uma sempre traumática demanda de mudança de guarda
etc..
Ao executar as mais diversas constrições judiciais, buscando
a máxima efetividade ao vencedor e a mínima lesividade ao vencido, o Oficial de
Justiça Sente a Sentença do Juiz. Por tal, deve ser o Oficial de Justiça
Imparcial seguindo o exemplo garantista dos magistrados na Seara Penal.
O Oficial de Justiça parcial age como um demônio, pois traz
às partes atribulação ao invés de paz. Este, que deveria chamar-se Oficial de
Injustiça transforma o Perfume de Justiça em Perfumaria de Direito, destruindo
todos os trabalhos dos sujeitos processuais, assim como as vidas das partes e o
próprio Estado Democrático de Direito.
Uma lei, qualquer que seja, que um dia resolva dar ao
Oficial de Justiça a incumbência de conciliar propondo soluções para as partes
deverá lhe retirar a capacidade de sentir a sentença dos magistrados, sob pena
de flagrante inconstitucionalidade.
“Oficial de Justiça Conciliador”, que pisa no campo
exclusivo da vontade partes e troca o “sentire” pelo “opinare” não consegue –
jamais - demonstrar sua imparcialidade nas demandas em que atua. O “Oficial de
Justiça Conciliador”, por mais que negue, contamina o processo, o magistrado e
a sociedade para a qual se volta a sentença.
Nietche tem um livro chamado “Assim Falou Zarastutra”, no
qual expõe que: "Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que
precisarás passar para atravessar o rio da vida. Ninguém, exceto tu, só tu.
Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se
oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria
pessoa; tu te hipotecarias e te perderias.". Quanto vale a imparcialidade
no exercício da profissão de Oficial de Justiça? A minha, “mes amis”, não tem
preço.
Por isso, qualquer proposta legislativa no sentido de que o
mesmo oficial de justiça que tentou conciliar atue constritivamente em relação
à demanda entre as partes é por mim peremptoriamente rechaçada!